quarta-feira, junho 12, 2013

O porquê do nascimento divino de Jesus

[Grão de Trigo, Dez. 2011, p. 6]

Tanto Mateus (1:18-25) como Lucas (1:26-56, 2:4-7) relatam o nascimento de Jesus como algo de natureza miraculosa. Apesar de humano, Jesus não partilha inteiramente a nossa natureza no seu nascimento, pois nasce de uma virgem que o concebeu apenas por acção do Espírito Santo. Para serem inequívocos de que não se trata de uma interpretação meramente simbólica, os evangelistas claramente afastam de José, único homem que Maria podia «conhecer», a possibilidade de uma paternidade humana de Jesus. Escreveram, por isso, que José não só não chegou a «conhecer» Maria antes de ela gerar Jesus, como só a «conheceu» depois do seu nascimento.

O nascimento de Jesus, nestas circunstâncias, não tem sentido apenas porque acreditamos que ele tem uma natureza divina. O importante não é que ele, para ser Deus, tivesse de nascer de Deus de um modo que não fosse aparentemente apenas humano. Não se trata simplesmente de proclamar uma filiação e um poder divinos para ser respeitado, temido e obedecido. A forma do seu nascimento tem a ver com aqueles que ele vem salvar, resgatar de uma condição que ele próprio em parte teve de assumir.

É para redimir que Jesus tem de vir ao mundo com a sua condição eterna, preexistente, intacta. Não para exercer poderes sobrenaturais que vergassem todos à sua vontade – o que não fez nem quis o Pai que fizesse –, mas para poder mediar eficazmente, apontando com autoridade plena para o Alto e para poder vencer a morte e sentar-se à direita do Pai como nosso intermediário. Para tal, não podia ser, como os profetas, um anunciador de coisas esperadas, sentidas, desejadas ou vislumbradas; tinha já de ser um portador de coisas vividas, reais, possuídas e em si mesmo demonstradas (como o Evangelho nos dá a ver). Jesus não poderia ser, na linguagem paulina, o Novo Adão se nascesse inteiramente do Velho Adão – embora, por outro lado e por intermédio de Maria, fosse co-herdeiro de Adão para poder partilhar a nossa natureza humana.

Pelas suas qualidades preexistentes, Jesus foi também o salvador da sua mãe humana, Maria, que era, como nós, herdeira do Velho Adão e da sua natureza decaída. Na sua qualidade de pecadora necessitada da salvação, Maria não era diferente de José ou de cada um de nós. Nisso também Jesus, o Deus connosco, foi profundamente humano, ao experimentar um amor filial sem limites, amando a sua mãe como nos amou a todos e trazendo-lhe a salvação de que estava tão necessitada como toda a descendência de Abraão. No seu cântico de graças, chamado Magnificat pela tradição, Maria soube ver o alcance da Encarnação, como remissão para todos, que estavam (e estão) caídos; ela própria, mãe humana de Jesus pela graça divina, estava incluída nos que esperavam o Filho como único remédio para esse estado de necessidade. A ela, como a nós, Jesus não lhe pertence nem veio ao mundo limitado pelos constrangimentos humanos; com algo em si de completamente distinto do nosso estado servil ao pecado, veio livre para nos fazer livres.

Glória a Deus!