terça-feira, julho 26, 2005

Século XX (n.º 28): O ano de 1927


ESTE ANO: As duas tentativas de golpe de Estado levadas a cabo durante este ano mostram que, desde Maio do ano anterior, a disputa do poder se deslocou para dentro das forças armadas. É no interior destas que os diferentes grupos políticos tentam influenciar o curso dos acontecimentos. Extremamente politizadas desde os anos finais da Monarquia, as forças armadas têm representadas no seu seio quase todas as correntes políticas nacionais. Apesar dos mais recentes exemplos de esforço de guerra por que passaram – as “campanhas de pacificação” em África no final do século passado e a intervenção na Grande Guerra – os seus oficiais são mais um conjunto de funcionários públicos fardados que um corpo disciplinado e profissional da guerra. No golpe de 28 de Maio de 1926 muitas expectativas divergentes haviam convergido no derrube de António Maria da Silva, mas o arrastamento da ditadura instaurada há um ano começa a impacientar grupos de oficiais que não se revêem nas lideranças entretanto definidas e nas opções tomadas. É isto que explica a primeira intentona ocorrida este ano, entre 3 e 10 de Fevereiro com a alegada cooperação de civis ligados aos democráticos, aos socialistas, anarquistas e até comunistas. Verificaram-se centenas de mortos, muitos mais feridos (na ordem dos milhares) e cerca de seis centenas de prisões e deportações. A segunda intentona, igualmente falhada, teve lugar a 12 de Agosto e mostra que outros quadrantes políticos estão já impacientes com a actual ditadura. Nela tomaram parte o eterno conspirador militar Filomeno da Câmara e o civil Fidelino de Figueiredo (na fotografia), pelo que ficou conhecido por “golpe dos fifis”, e pendia para uma solução política autoritária. O modelo autoritário, tanto inspirado na experiência fascista de Mussolini como na republicana de Kemal Ataturk tem cada vez mais audiência entre neomonárquicos integralistas e republicanos. A derrota de ambas as tentativas golpistas vem solidificar a liderança de Oscar Carmona e diminuir a influência dos sectores afectos às duas intentonas, nomeadamente à primeira, maior e mais significativa. Mas estes acontecimentos mostram também que a ditadura militar tem ainda uma orientação política indefinida, recusando as duas vias extremistas ensaiadas em Fevereiro e Julho deste ano.

BREVES: --- Empréstimo e política: A duração da ditadura impacienta os profissionais da política e, em meados de Janeiro, os partidos democrático, nacionalista, radical, esquerda democrática, socialistas e o grupo Seara Nova contestam junto das embaixadas inglesa, francesa e norte-americana a possibilidade da S.D.N. aprovar um empréstimo ao governo da ditadura, considerado ilegítimo. Após a detenção de alguns dos opositores e a derrota da tentativa golpista de princípios de Fevereiro, o corpo diplomático e as organizações empresariais manifestarão o seu apoio à ditadura. --- Nova revista: A 10 de Março começou a publicar-se em Coimbra a revista Presença, dirigida por José Régio e João Gaspar Simões entre outros e que se manterá até 1940. --- Repressão: São destruídas a 6 de Maio as instalações do diário A Batalha, propriedade da Confederação Geral dos Trabalhadores. A sede desta é encerrada pela Polícia a 2 de Novembro. --- Finanças: O professor Salazar entrega ao ministro das Finanças o relatório da comissão de reforma do sistema fiscal; as propostas serão recusadas pelo governo, que continua a apostar num empréstimo. --- Contestação estudantil: A 1 de Dezembro, sobretudo com alunos da Faculdade de Direito de Lisboa, tem lugar uma manifestação contra a ditadura.

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